01/05/2012

nesta grande época...

[...] Nos reinos de escassez de fantasia, onde os seres humanos estão morrendo de pobreza espiritual sem se atentar à fome que consome suas almas, em que a caneta se embebede de sangue e a espada de tinta, há que se fazer o que se pensa. Mas o que só se pensa é, me parece, impronunciável.
[...] Minhas palavras poderiam soar mais fortes que as máquinas, mas, ainda assim, não poderiam fazer-lhes frente. Nem sequer seria capaz de fazê-lo com uma máquina maior. Até os ouvidos que vivem ouvindo as trombetas do Juízo Final não se fecham por muito tempo às trombetas [manchetes] do dia. A imundice da vida não se paralisou pelo espanto, a tinta não se empalideceu fronte tanto sangue, mas a boca sim se abriu para tragar todas as espadas, de modo que não vemos mais boca. E medimos a grandeza somente pela boca.
[...] Décadas de excitação levaram a humanidade justamente para o nível da pobreza de fantasia, que torna possível uma guerra de extermínio contra si mesma. A aceleração desmedida dos seus aparatos lhe subtraiu toda a capacidade para a vida, e o desenvolvimento espiritual, próprio desta, pôde lhe dar a coragem necessária para morrer. Coragem com a qual a humanidade se precipita.
[...] A denúncia da barbárie na guerra é qualquer coisa. Contudo, a barbárie na paz - que reside na disponibilidade de fazer rimas quando a coisa está séria, e na de fazer um editorial com a vida dos outros - é uma humilhação impagável.

Karl Kraus,
na sua guerra contra a imprensa, que, para ele, foi a principal responsável pela eclosão da Grande Guerra.
In dieser grossen Zeit. Die Fackel 404, 5 de dezembro de 1914.

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